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Revista oficial da Associação Brasileira de Alergia e Imunologia ASBAI
Revista oficial da Sociedad Latinoamericana de Alergia, Asma e Inmunología SLaai

Número Atual:  Abril-Junho 2024 - Volume 8  - Número 2


CARTA AO EDITOR

Testes de provocação na urticária colinérgica: necessidades não atendidas

Provocation tests in cholinergic urticaria: unmet needs

Guilherme Gomes Azizi; Sérgio Duarte Dortas-Junior; Rossy Moreira Bastos-Junior; Omar Lupi; Solange Oliveira Rodrigues Valle


Universidade Federal do Rio de Janeiro, Serviço de Imunologia - Rio de Janeiro, RJ, Brasil


Não foram declarados conflitos de interesse associados à publicação desta carta.




Caro Editor,

A urticária é uma doença cutânea definida pelo surgimento de urticas, angioedema ou ambos. A urtica é uma lesão eritematoedematosa de tamanho variável e intenso prurido, ocorrendo em reação a consequente vasodilatação e aumento da permeabilidade vascular na derme superficial. As lesões apresentam natureza fugaz com retorno da pele ao seu aspecto normal entre 30 minutos e 24 horas, sem deixar lesão residual. O angioedema apresenta-se como edema súbito e pronunciado da derme profunda, subcutâneo ou mucosas, com sensação de dor e queimação superiores ao prurido, com resolução gradual em até 72 horas.

A urticária é classificada quanto ao tempo de duração das manifestações clínicas em urticária aguda (menos de 6 semanas), e urticária crônica (maior ou igual a 6 semanas). A urticária crônica pode ocorrer de forma espontânea ou induzida por estímulos específicos, os quais são diagnosticados através de teste de provocação direcionado aos gatilhos externos.

As urticárias crônicas induzidas (UCInds) podem ser subdividas de acordo com o estímulo externo, sendo classificadas em físicas (dermografismo, urticária de pressão tardia, urticária ao frio, ao calor, solar e vibratória) e não físicas (urticária adrenérgica, de contato, aquagênica e colinérgica). A urticária colinérgica (UCol) possui o suor como base em sua gênese e ocorre por aquecimento sistêmico, diferentemente de alguns diagnósticos diferenciais, como a urticária ao calor (UCal), que possui como estímulo primário o calor externo localizado, ou a urticária solar (US), relacionada à exposição a raios UVA, UVB ou luz visível.

A primeira descrição da UCol foi feita por Duke, em 1924, sendo caracterizada pelo surgimento de lesões micropapulares altamente pruriginosas ou dolorosas com eritema circundante, relacionadas ao aumento da temperatura corporal a partir de exercício físico, banhos quentes, estresse emocional, comidas picantes ou bebidas quentes. As lesões possuem aproximadamente entre 1 e 3 mm, localizando-se em qualquer parte do corpo, exceto nas palmas das mãos, região plantar e axilas, todavia, afeta principalmente o tronco e membros superiores. Estas pequenas pápulas podem coalescer e formar uma grande urtica. Os sintomas geralmente desaparecem rapidamente, não ultrapassando o período de 1 hora. Os sintomas podem piorar em temperaturas ambientais mais elevadas, embora alguns pacientes descrevam o surgimento de lesões em ambientes de baixa temperatura e, principalmente, durante a atividade física.

A UCol possui sua incidência e prevalência predominantemente entre a segunda e terceira décadas de vida. Não há diferença de prevalência entre os sexos masculino e feminino. Alguns estudos sugerem uma prevalência estimada de 4,1-11,2% na população em geral.

Em um estudo com 111 participantes buscou-se caracterizar as necessidades médicas não atendidas de pacientes em relação à avaliação e o acompanhamento da UCol em países de língua alemãs. Através de uma pesquisa online, os autores questionaram os pacientes sobre a sintomatologia, atraso no diagnóstico, impacto na vida diária, qualidade de vida e experiência com atendimento médico. Praticamente todos os pacientes relataram sinais e sintomas típicos de UCol, todavia, relataram atraso significativo no diagnóstico de 30,2 meses (variação de 0 a 279 meses). Apenas 16% foram submetidos a testes de provocação, demonstrando a carência de testes diagnósticos de aplicação prática. Noventa por cento dos pacientes afirmaram ter doença não controlada, resultando em forte impacto em suas atividades diárias, sono e qualidade de vida. O estudo apresenta a necessidade iminente de melhoria na investigação diagnóstica e no atendimento ao paciente, assim como melhores opções de tratamento1.

A etiologia de cada subtipo de UCol está sendo gradualmente investigada e elucidada, mas a fisiopatologia geral ainda não é totalmente compreendida. A fisiopatologia envolve acetilcolina, oclusão de poros, receptor colinérgico M3 (CHRM3), alergia a componentes do suor, fatores inflamatórios séricos e desidrose, e cada subtipo de UCol sugere apresentar causas diferentes ou mistas. A fisiopatologia proposta da UCol, ainda, apresenta-se com inúmeras lacunas, entretanto foram propostos quatro subtipos de UCol: tipo I - UCol com alergia ao suor, tipo II - UCol do tipo folicular, tipo III - UCol com angioedema palpebral (UCol AEP), e tipo IV - UCol com anidrose e/ou hipoidrose adquirida2. A histamina é um mediador envolvido de maneira equiparável em todos os subtipos relatados.

Diferente de outros tipos de urticária, muitos pacientes com UCol queixam-se de parestesia, o que tem grande impacto na qualidade de vida destes pacientes. A UCol é uma doença que altera drasticamente o conceito de bem-estar biopsicossocial do indivíduo, pois notadamente é uma patologia que diminui a qualidade de vida, favorece a automedicação indiscriminada e o absenteísmo. A UCol possui sua incidência e prevalência predominantemente entre a segunda e terceira décadas de vida. As lesões tendem a durar 15 a 60 minutos e podem estar associadas ao angioedema local. Na suspeita de UCol é importante diferenciá-la da anafilaxia induzida pelo exercício, urticária aquagênica, UCol induzida pelo frio, urticária ao calor e urticária solar.1­2

O teste de provocação para confirmar UCol também possui como objetivo afastar o diagnóstico de anafilaxia induzida pelo exercício. Deve-se ter cautela ao realizar o teste em indivíduos cardiopatas, e analisar pacientes com outras apresentações de lesões cutâneas. É consenso que um aumento na temperatura corporal acima 1 ºC da linha de base, conforme indicado por um teste de aquecimento passivo sentado por ≤ 15 min em um banho com água a 42 ºC confirma o diagnóstico de UCol2.

Um protocolo padronizado foi proposto para diagnosticar e medir os limiares de UCol, usando bicicleta ergométrica com controle da frequência cardíaca e temperatura. O teste é realizado por ergometria com controle da frequência cardíaca. O paciente se posiciona na bicicleta ergométrica e inicia as pedaladas, sendo instruído de maneira que a pulsação se eleve em 15 batimentos por minuto a cada 5 minutos, alcançando 90 batimentos por minuto acima do nível basal após 30 minutos. Além disso, afere-se a temperatura durante o processo. O tempo para o surgimento da urticária é inversamente proporcional à intensidade da doença, ou seja, quanto menor o tempo para o surgimento das lesões, mais grave é considerada a UCol3.

A UCol é extremamente degradante para o bem-estar biopsicossocial do indivíduo, e ainda carece de testes de provocação e ferramentas que possam ser facilmente reproduzidas em ambientes externos aos centros de referências. Assim, há necessidade de novas técnicas de baixo custo, baixo aporte tecnológico, seguras e com boa reprodutibilidade que possam auxiliar o diagnóstico do médico especialista em seu ambulatório particular ou a atenção primária em saúde, principalmente, no SUS, e em países em desenvolvimento.

 

Referências

1. Mellerowicz E, Weller K, Zuberbier T, Maurer M, Altrichter S. Real-life treatment of patients with cholinergic urticaria in German-speaking countries. J Dtsch Dermatol Ges. 2019 Nov;17(11):1141-7.

2. Fukunaga A, Oda Y, Imamura S, Mizuno M, Fukumoto T, Washio K. Cholinergic Urticaria: Subtype Classification and Clinical Approach. Am J Clin Dermatol. 2022 Sep 15:1-14.

3. Altrichter S, Salow J, Ardelean E, Church MK, Werner A, Maurer M. Development of a standardized pulse controlled ergometry test for diagnosing and investigating cholinergic urticaria. J Dermatol Sci. 2014;75(2):88-93.

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