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Revista oficial da Associação Brasileira de Alergia e Imunologia ASBAI
Revista oficial da Sociedad Latinoamericana de Alergia, Asma e Inmunología SLaai

Número Atual:  Abril-Junho 2021 - Volume 5  - Número 2


Artigo Original

Preferência por comportamentos favoráveis à prática de atividade física em crianças com sintomas de asma e/ou rinite

Preference for behavior conducive to physical activity in children with symptoms of asthma and/or rhinitis

Aline Piovezan1; Karoliny dos-Santos2; Bruna Becker da-Silva2; Jefferson Traebert2; Aline Daiane Schlindwein3


DOI: 10.5935/2526-5393.20210026

1. Universidade do Sul de Santa Catarina, Curso de Medicina - Palhoça, SC, Brasil
2. Universidade do Sul de Santa Catarina, Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde - Palhoça, SC, Brasil
3. Secretaria de Estado da Saúde de Santa Catarina, Diretoria Permanente de Educação em Saúde - Florianópolis, SC, Brasil


Endereço para correspondência:

Aline Daiane Schlindwein
E-mail: alineds10@yahoo.com.br


Submetido em: 24/09/2020
Aceito em: 24/03/2021

Financiamento: Projeto Coorte Brasil Sul - FAPESC Processo n° 2016TR222 - PPGCS/UNISUL, Palhoça, SC

Não foram declarados conflitos de interesse associados à publicação deste artigo.

RESUMO

INTRODUÇÃO: A asma e a rinite parecem influenciar de diversas for-mas aspectos da vida das crianças, incluindo o comprometimento do nível de atividade física.
OBJETIVO: Analisar a preferência por comportamentos favoráveis à prática de atividade física e o nível de atividade física de crianças de 6 a 7 anos com sintomas de asma e/ou rinite em uma cidade do Sul do Brasil.
MÉTODO: Foi realizado um estudo transversal, que estimou a presença de sintomas de asma e de rinite através do questionário International Study of Asthma and Allergy in Childhood e sua relação com a preferência por comportamentos favoráveis à prática de atividade física e com o nível de atividade física avaliados com o Netherlands Physical Activity Questionnaire. O teste t de Student foi utilizado para verificar a associação entre as variáveis independentes e os comportamentos favoráveis à prática de atividade física e o nível de atividade física. ANOVA uma via, seguida do teste post hoc de Tukey foram utilizados para comparar os comportamentos favoráveis à prática de atividade física e o nível de atividade física entre grupos.
RESULTADOS: Participaram do estudo 282 crianças, nestas os sintomas de rinite foram os mais prevalentes, presentes em 20,2% das crianças. A associação de sintomas de asma e rinite foi constatada em 17,7% das crianças, e a presença isolada de sintomas de asma em 12,1%. Em relação ao nível de atividade física, os meninos obtiveram pontuação significativamente maior em relação à preferência por brincadeiras agitadas (p = 0,02) e prática de esportes (p = 0,01), o mesmo para crianças com sintomas de asma ou rinite.
CONCLUSÃO: Não foi detectada relação entre o nível de atividade física e os sintomas de asma e rinite entre os participantes.

Descritores: Asma, rinite, exercício físico, criança.




INTRODUÇÃO

A asma tem se mostrado uma condição de alto impacto e alta prevalência entre as crianças brasileiras1 e pode ser definida como uma doença heterogênea caracterizada por inflamação crônica das vias aéreas e história de sintomas respiratórios como sibilos, falta de ar, opressão torácica e tosse, que variam ao longo do tempo e em intensidade, associados a limitação variável do fluxo expiratório2. Já a rinite, apresenta-se como uma inflamação da mucosa de revestimento nasal, caracterizada pela presença de um ou mais dos seguintes sintomas: obstrução nasal, rinorreia, espirros, prurido e hiposmia3. Asma e rinite são condições que se encontram muitas vezes associadas em crianças e estima-se que 60 a 80% das que possuem asma também apresentem sintomas de rinite4,5.

O Brasil encontra-se entre os países com as maiores prevalências de asma do mundo6. O Estudo Internacional de Asma e Alergias na Infância (ISAAC), desenvolvido a partir de 1990 com o objetivo de padronizar a avaliação da prevalência e gravidade da asma, rinite e eczema em crianças em diferentes populações7, mostrou uma prevalência média de 24,3% de asma em crianças entre 6 e 7 anos nos centros brasileiros pesquisados8. Na Região Sul, a prevalência de asma foi de 20,6%, e dessas crianças, 6,8% apresentavam asma grave8. Com relação à prevalência de rinite, o Brasil apresentou uma taxa de 25,7% e, no Sul do país, de 19,3%, sendo 14% desses casos considerados rinite grave, interferindo nas atividades diárias das crianças8. As taxas de prevalência de as-ma no mundo avaliadas em diversos centros através do ISAAC mostraram uma relação concordante com as taxas de prevalência de rinite6,9.

Tanto a asma quanto a rinite podem ter um impacto significativo em vários aspectos da vida das pessoas10. Entre estes aspectos, pode-se destacar o comprometimento do nível de atividade física que aparece alterado em crianças com asma11,12, podendo resultar em maior risco de sobrepeso13, sintomas emocionais11 e outras consequências, afetando a saúde da população. Alguns estudos têm evidenciado uma diminuição dos níveis de atividade física em crianças asmáticas11,12. Estas relatam menos atividades físicas do que as não asmáticas e a presença de asma aparece como o preditor mais forte de atividades físicas diminuídas, apresentando-se como uma barreira significativa ao exercício11. As atividades físicas de lazer, como brincadeiras ao ar livre com amigos e andar de bicicleta, são afetadas de forma similar com uma diminuição do tempo dedicado a elas quando comparado ao tempo de atividades físicas de lazer em crianças saudáveis12.

A escassez de estudos que avaliam a preferência por comportamentos favoráveis à prática de atividade física e o nível de atividade física em crianças que apresentam asma e/ou rinite destaca a importância desta avaliação, considerando que a associação entre as duas apresenta uma alta prevalência4,5. Conhecer o padrão de atividade física destas crianças pode servir para otimizar medidas de intervenção, contribuindo para o desenvolvimento de hábitos saudáveis, uma vez que crianças que não tiverem experiências agradáveis relacionadas à atividade física desde cedo, terão mais dificuldades em manter níveis saudáveis de atividade física quando adultos11. Sendo assim, o presente estudo tem como objetivo analisar a preferência por comportamentos favoráveis à prática de atividade física e o nível de atividade física de crianças de 6 a 7 anos com sintomas de asma e/ou rinite em um município do Sul do Brasil.

 

MÉTODOS

Foi realizado um estudo observacional de delineamento transversal com crianças aos 6-7 anos de idade da cidade de Palhoça, Santa Catarina, participantes do projeto Coorte Brasil Sul14.

No município havia 1.900 crianças matriculadas que cumpriam os critérios de inclusão, entretanto somente 1.270 crianças participaram do estudo, cujos pais ou responsáveis legais assinaram termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE). Foi aplicado um questionário estruturado e previamente testado em um estudo piloto, que contém perguntas referentes ao período gestacional e primeiros dois anos de vida da criança, bem como ao período atual da criança14. O período de coleta com aplicação dos questionários ocorreu do final do mês de novembro de 2015 ao final do mês de julho de 2017, o qual foi realizado por agentes comunitárias de saúde capacitadas para a aplicação dos questionários, os quais foram respondidos pelas mães ou o principal cuidador da criança nas residências.

Como critério de inclusão as crianças deveriam estar regularmente matriculadas nas escolas públicas e privadas do município de Palhoça, e ter nascido no ano de 2009. Considerou-se perda, crianças cujas mães ou o principal cuidador não foram encontrados em casa após três visitas, incluindo uma no fim de semana, assim como aqueles que se recusaram a assinar o TCLE, e foram excluídas as crianças cujos questionários estivessem incompletos ou com erros no preenchimento14.

A seleção da amostra para o presente estudo foi feita por amostragem probabilística aleatória. O tamanho da amostra foi calculado no programa Lee do Laboratório de Epidemiologia e Estatística da Faculdade de Medicina da USP15. Os dados levaram em consideração a diferença encontrada na pontuação do Netherlands Physical Activity Questionnaire entre os grupos "com sintomas de asma e/ou rinite" e "sem sintomas de asma e/ou rinite" em um projeto piloto com avaliação de 40 crianças. Considerando nível de confiança de 95%, poder de 80% para aferir uma diferença entre as médias de 0,20 e desvio padrão de 0,60, estimou-se um tamanho amostral de 141 crianças para cada grupo, totalizando 282 crianças. Os dados referentes às 282 crianças selecionadas como parte da amostra foram extraídos do banco de dados da Coorte Brasil Sul14.

A avaliação das crianças em relação à presença de sintomas de asma e de rinite foi realizada através do questionário ISAAC, que se apresenta dividido em módulos e foi previamente traduzido para o português e validado no Brasil16,17, sendo utilizado em estudos epidemiológicos de prevalência de asma e doenças alérgicas em crianças e adolescentes.

O módulo referente a asma, validado no Brasil por Solé e cols.16, contém oito questões relacionadas aos sintomas, gravidade da doença e seu diagnóstico. São considerados indivíduos com sintomas de asma atual aqueles que responderam afirmativamente à questão que interroga sobre a presença de sibilo nos últimos 12 meses. Validado no Brasil por Vanna e cols.17, o módulo sobre rinite contém seis questões relativas aos sintomas da rinite, rinoconjuntivite alérgica e formas mais graves de rinite. Respostas positivas à questão sobre a presença de espirro, coriza e obstrução nasal nos últimos 12 meses demonstra a presença atual de sintomas de rinite.

Para avaliar a preferência por comportamentos favoráveis à prática de atividade física e verificar o nível de atividade física, foi utilizado o Netherlands Physical Activity Questionnaire (NPAQ), desenvolvido com o objetivo de avaliar a prática de atividade física em crianças. O NPAQ é composto por sete questões através das quais os pais relatam as preferências das crianças com relação a determinadas atividades. Cada questão possui um escore que pode variar de 1 a 5 pontos. Para a opção menos ativa, pontua-se 1, e para opção mais ativa, pontua-se 5. O escore final é formado pela somatória do escore de cada questão. A pontuação total pode variar de 7 a 35 pontos18.

Os dados foram tabulados utilizando o software Microsoft Excel®, e posteriormente analisados por meio do programa IBM SPSS Statistics versão 18.0. Os dados qualitativos como sexo e presença de asma e/ou rinite são apresentados na forma de frequências (simples e relativa), e os dados quantitativos como os comportamentos favoráveis à prática de atividade física e o nível de atividade física, em medidas de tendência central (média) e desvio padrão. Para verificar a associação entre as variáveis independentes e os comportamentos favoráveis à prática de atividade física e o nível de atividade física foi utilizado o teste t de Student. Para comparar os comportamentos favoráveis à prática de atividade física e o nível de atividade física entre os grupos "asma", "rinite", "asma e rinite" e "controle", foi realizada a análise de variância (ANOVA uma via), seguida do teste post hoc de Tukey. O nível de significância estatística adotado foi de 5%.

O projeto foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa envolvendo Seres Humanos da Universidade do Sul de Santa Catarina (UNISUL), sendo aprovado sob número CAAE 38240114.0.0000.5369.Todos os pais e/ou responsáveis assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido.

 

RESULTADOS

O presente estudo avaliou 282 crianças. Pouco mais da metade das crianças avaliadas (50,4%, 142 crianças) era do sexo masculino, e metade delas não relatou nenhum sintoma relacionado a asma e rinite. Sintomas de rinite foram os mais prevalentes, presentes em 20,2% (57) das crianças. A associação de sintomas de asma e rinite foi constatada em 17,7%

(50) das crianças, e a presença isolada de sintomas de asma em 12,1% (34). A maioria das crianças que apresentaram apenas sintomas de asma eram do sexo masculino (61,8%-21 crianças) conforme observado na Tabela 1. Os meninos também foram maioria no grupo de crianças com apenas sintomas de rinite (52,6%-30 crianças) e no grupo com associação de sintomas de asma e rinite (54,0%-27 crianças).

 

 

Com relação à preferência por comportamentos favoráveis à pratica de atividade física (Tabela 2), a questão relacionada a gostar de praticar esportes como jogar bola e andar de bicicleta apresentou a maior pontuação média dentre as demais (3,98±1,23), enquanto a questão relacionada à falta de interesse por desenhar, pintar ou ver revistas apresentou a menor pontuação (2,00±1,32). A média da pontuação total do questionário que se relaciona ao nível de atividade física foi de 24,3±4,66.

 

 

Quando categorizadas as opções de resposta de cada questão em "sempre", "quase sempre" e "tanto faz" para cada comportamento, a prevalência dos comportamentos favoráveis à prática de atividade física se apresenta como disposto na Tabela 3. A questão relativa a gostar de praticar esportes, como jogar bola e andar de bicicleta apresentou a maior frequência de respostas favoráveis à prática de atividade física, enquanto a questão referente a gostar de desenhar, pintar ou ver revistas apresentou a maior frequência de respostas relacionadas ao comportamento considerado menos ativo.

 

 

A associação entre as características estudadas e a pontuação obtida em cada questão do NPAQ é demonstrada na Tabela 4, sendo que os grupos com maiores médias apresentaram preferências por comportamentos mais favoráveis à atividade física (Tabela 4).

 

 

As variáveis independentes estudadas não se mostraram estatisticamente associadas com maior pontuação nas questões relativas à preferência por brincar com outras crianças, à maior extroversão, à preferência por brincadeiras na rua ou pátio e a ser mais ativo fisicamente do que crianças da mesma idade. Os meninos apresentaram uma pontuação significativamente maior com relação a preferência por brincadeiras agitadas (p = 0,02) do que as meninas, o que também ocorreu na questão referente a gostar de praticar esportes (p = 0,01). Na questão referente à falta de interesse por desenhar, os meninos apresentaram uma pontuação significativamente maior (p < 0,01), assim como as crianças com sintomas de asma (p = 0,04) e com sintomas de asma e rinite associados (p < 0,01) quando comparadas às crianças sem sintomas. O nível de atividade física não apresentou diferença significativa em nenhuma categoria das variáveis independentes.

Quando comparada a pontuação de cada questão referente aos comportamentos favoráveis à prática de atividade física entre os grupos, observa-se que não houve diferença significativa em nenhuma das questões, com exceção da questão referente a gostar de desenhar, pintar ou ver revistas, como observado na Figura 1. As crianças com apenas sintomas de asma (p = 0,01) e as crianças com sintomas de asma e de rinite (p = 0,003) apresentaram uma pontuação significativamente maior que as crianças assintomáticas.

 


Figura 1
Comparação entre a pontuação das perguntas do Netherlands Physical Activity Questionnaire (NPAQ) entre os grupos de crianças com apenas sintomas de asma, crianças com apenas sintomas de rinite, crianças com sintomas de asma e rinite, e crianças assintomáticas em uma cidade do Sul do Brasil
Valores de p obtidos pela ANOVA oneway, seguida do teste post hoc de Tukey. * p= 0,019. ** p= 0,003.

 

DISCUSSÃO

O presente estudo teve como objetivo avaliar a preferência por comportamentos favoráveis à prática de atividade física em crianças de 6 a 7 anos que apresentavam sintomas de asma e/ou rinite em um município do Sul do Brasil.

Dentre as crianças com sintomas, houve um predomínio de sintomas de rinite, cuja prevalência se apresentou semelhante à prevalência avaliada também através do ISAAC no Brasil (25,7%), e no Sul do país (19,3%) em 20068. A prevalência de sintomas de asma encontrada neste estudo foi menor quando comparada à prevalência brasileira (24,3%) e à prevalência na Região Sul (20,6%)8 em crianças de 6 a 7 anos. Valores semelhantes à prevalência no Brasil também foram encontrados em crianças da mesma faixa etária nas cidades de Curitiba (22,9%), Porto Alegre (23,5%) e São Paulo (21,3%)1.

Gostar de praticar esportes como jogar bola e andar de bicicleta foi o comportamento ativo mais relatado, quando avaliadas todas as crianças. No estudo de Bielemann e cols.19, que avaliou os comportamentos relacionados à prática de atividade física em crianças de 4 a 11 anos da cidade de Pelotas (RS), a questão referente a este comportamento apresentou 87,5% de respostas favoráveis à prática de atividade física, enquanto a questão referente a gostar de desenhar, pintar ou ver revistas apresentou 75,3% de respostas relacionadas ao comportamento considerado menos ativo, sendo respectivamente as questões com maior e menor pontuação, apresentando o mesmo padrão do presente estudo.

O nível de atividade física, avaliado a partir da pontuação total do NPAQ, não apresentou diferença significativa entre os grupos avaliados. Nenhuma diferença entre o nível de atividade física em crianças com 4 a 5 anos de idade com e sem sintomas de asma também foi observada por Eijkemans e cols.20. De modo similar, uma metanálise recentemente publicada demonstrou não haver evidência de que crianças e adolescentes com e sem asma tenham níveis diferentes de atividade física quando esta foi medida objetivamente por acelerômetros21. Apesar destes achados, em alguns estudos a asma tem sido associada a um menor nível de atividade física11,12 e a uma alteração na capacidade física em crianças22. Quando avaliadas com o teste de caminhada de seis minutos, crianças com asma moderada a grave percorreram uma distância significativamente menor que os valores preditos para controles saudáveis, sendo o estilo de vida sedentário o principal fator a influenciar a distância percorrida22. Em estudo realizado por Glazebrook e cols.11, quando questionadas sobre atividades físicas nas últimas 24 horas, crianças com asma relataram menos atividades do que as não asmáticas, apesar de apresentarem uma quantidade similar de atividades sedentárias no mesmo período. Entretanto, o sedentarismo pode não estar tão relacionado à asma como se imagina. Matsunaga e cols.23 mostraram que 54% das crianças com asma avaliadas por meio de questionários quanto ao nível de atividade foram classificadas como muito ativas, e apenas 29% como sedentárias.

No presente estudo não houve diferença significativa entre os grupos com relação aos comportamentos apresentados, com exceção da questão referente a gostar de desenhar, pintar ou ver revistas. As crianças com sintomas de asma associados ou não a sintomas de rinite apresentaram menor interesse por desenhar quando comparadas às crianças assintomáticas. Divergindo dos achados encontrados no presente estudo, Poongadan e cols.24 verificaram que comportamentos sedentários, como assistir televisão e jogar videogame, se mostraram fortemente associados à presença de sintomas de asma. No estudo de Arvanniti e cols.25, nas crianças que passavam mais de duas horas por dia assistindo televisão ou jogando videogame, houve uma prevalência significativamente maior de sintomas de asma do que entre aquelas que permaneciam menos de duas horas em frente à televisão. Outro fator que também pode estar associado à diminuição da atividade física nas crianças asmáticas é a restrição das atividades pelos pais11,26. A maioria dos pais acredita que a asma seja uma barreira para realização de atividade física pelos filhos11 e algumas mães admitem impor restrições, acreditando que as atividades possam piorar os sintomas da asma26. Esse comportamento pode desencorajar as crianças, contribuindo para que elas sejam menos ativas26. As crianças com sintomas de asma do presente estudo possivelmente tenham menor interesse por comportamentos menos ativos como desenhar, por serem estimuladas à prática de atividade física por profissionais de saúde ou pais e professores orientados sobre a importância do exercício no controle da asma, entretanto estes fatores não foram objetivamente avaliados.

Os resultados conflitantes com os encontrados na literatura podem ter ocorrido, pois o presente estudo não avaliou o grau de controle da doença. Gazzotti e cols.27 mostraram em seu estudo que crianças de 12 anos com asma não controlada apresentaram um maior impacto da doença nas atividades diárias e no esforço físico quando comparadas àquelas com asma controlada. Outra hipótese a ser considerada consiste no fato de que as crianças com asma podem ter se exercitado mais para um maior cuidado com a saúde, como também as crianças com um maior nível de atividade física possam apresentar sibilos pela presença de broncoespasmo induzido pelo exercício28. O broncoespasmo induzido pelo exercício está fortemente relacionado à presença de asma e dos seus sintomas e também pode acontecer em pacientes que apresentam rinite na ausência de asma29.

O presente estudo apresenta algumas limitações. O nível de atividade física não pôde ser mensurado objetivamente com pedômetros ou acelerômetros, estes últimos considerados padrão ouro. O instrumento utilizado no presente estudo, apesar de possuir uma capacidade de predição do nível de atividade física baixa, apresenta uma correlação com o padrão ouro similar ao apresentado por outros questionários18. Além disso, o NPAQ é uma ferramenta validada para o uso na população brasileira, sendo um dos poucos disponíveis para avaliação da faixa etária incluída neste estudo.

Em síntese, este estudo não demonstrou relação entre o nível de atividade física e a presença de sintomas de asma e rinite nas crianças avaliadas. O único comportamento que apresentou diferença significativa entre os grupos foi a preferência por desenhar, pintar ou ver revistas, sendo esta menor nas crianças com sintomas de asma associados ou não a sintomas de rinite. Futuros estudos com uma avaliação objetiva do nível de atividade física nesses grupos são necessários, e devem considerar uma avaliação mais global destas crianças, atentando-se para a gravidade e o controle da doença, bem como o estímulo à prática de atividade física por parte de pais, profissionais de saúde e professores.

 

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