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Revista oficial da Associação Brasileira de Alergia e Imunologia ASBAI
Revista oficial da Sociedad Latinoamericana de Alergia, Asma e Inmunología SLaai

Número Atual:  Julho-Setembro 2022 - Volume 6  - Número 3


Editorial

Asma na infância: a adesão ao tratamento é fundamental para atingir-se o controle?

Childhood asthma: is adherence to treatment essential for achieving control?

Dirceu Solé


DOI: 10.5935/2526-5393.20220034

Professor Titular e Livre Docente da Disciplina de Alergia, Imunologia e Reumatologia, Departamento de Pediatria, Universidade Federal de São Paulo- Escola Paulista de Medicina. Diretor de Pesquisa da Associação Brasileira de Alergia e Imunologia (ASBAI). Diretor Científico da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP)




Nas últimas décadas temos assistido ao aumento na prevalência, bem como na gravidade das doenças alérgicas em todo o mundo, em todas as faixas etárias, sobretudo na infância.

Seguramente, a asma continua sendo a doença crônica pulmonar com maior prevalência na criança e no adolescente e requer cuidados especiais, sobretudo educacionais. Embora na atualidade, cada vez mais novos fenótipos e endotipos de asma tenham sido identificados, com vistas a proporcionar uma terapia alvo mais efetiva e duradoura, o seu controle ainda é a meta final do seu tratamento1.

A literatura médica é unânime em apontar que a baixa adesão ao tratamento da asma pelos pacientes é a principal causa de exacerbações e baixo controle, o que determina custos elevados com cuidados de saúde, e tem sido identificada como fator responsável por mortes por asma1.

A Global Initiative for Asthma (GINA) aponta a redução dos sintomas, assim como a minimização de riscos futuros de desfechos desfavoráveis como pontos principais na avaliação do controle da asma. É recomendável que essa avaliação ocorra a cada quatro semanas e que nela se busque identificar possíveis fatores de risco para exacerbações, limitação persistente do fluxo aéreo (avaliar a função pulmonar em tempos específicos), a adesão ao esquema terapêutico instituído, além de efeitos colaterais dos medicamentos1.

No seguimento dos pacientes com asma, salienta a GINA, é importante certificar-se do nível terapêutico em que o paciente se encontra, se a técnica inalatória instituída está adequada, acompanhar a adesão ao esquema prescrito e os efeitos adversos, checar se o paciente está seguindo o plano escrito de ação, além de indagar sobre atitudes/comportamentos que vêm sendo tomados, assim como as metas a atingir com relação a sua asma. A presença de comorbidades (rinite, rinossinusite, refluxo gastroesofageano, obesidade, depressão/ansiedade, entre outras) também deve ser considerada1.

Diante de um paciente com asma mal controlada é imperativo que fatores potencialmente contribuintes para a baixa adesão ao tratamento sejam avaliados, destacando-se: (a) relacionados aos medicamentos/regime de tratamento (dificuldade no uso dos dispositivos inalatórios, administração várias vezes ao dia, uso de vários e diferentes inaladores); (b) má adesão não intencional (mal entendimento das instruções/recomendações para o uso dos medicamentos, esquecimento, ausência de rotina diária e custo); e (c) má adesão intencional (percepção de que o tratamento é desnecessário, negação ou raiva a respeito da asma e seu tratamento, expectativas inapropriadas com relação ao tratamento/doença, preocupações sobre efeitos adversos, insatisfação com os prestadores de cuidados de saúde, estigmatização, questões culturais ou religiosas e o custo)1.

Outro tópico a considerar diz respeito ao método a ser empregado para quantificar a adesão dos pacientes aos esquemas propostos visando detectar-se a má adesão e possibilitar a intervenção para alterar esse comportamento modificável.

Vários métodos têm sido propostos para avaliar/monitorar a adesão ao tratamento da asma em adultos e crianças. Entre eles destacamos: (a) ferramentas de avaliação subjetiva (avaliação médica, pelos familiares/paciente, questionários autorrespondidos: Escala de Morisky, Escala de Relato de Adesão a Medicamentos - Asma (MARS-A); (b) ferramentas objetivas: dados de prescrição, peso dos dispositivos inalados, marcador de doses, terapia monitorada diretamente, visitas domiciliares de enfermagem; e (c) dispositivos eletrônicos de monitoramento (DOSER CT®, SmartInhalers®, Propeller Health ou Asthmapolis Device®, Dispositivo de Avaliação de Conformidade do Inalador - INCA). Vale destacar que esses métodos objetivos e subjetivos que medem a adesão têm vários senões e mesmo os considerados "padrão ouro", como os sistemas de monitoramento eletrônico, têm limitações2,3.

Neste número dos AAAI, Serrano e cols. apresentam estudo observacional transversal, cujo objetivo foi avaliar a importância da adesão ao tratamento da asma em população pediátrica (n = 98) acompanhada em serviço especializado há pelo menos seis meses e sua relação com o controle da doença (82% de formas moderada e grave), bem como de outras variáveis clínicas4. Para tanto, os autores utilizaram, durante as avaliações de seguimento, questionários sobre adesão ao uso de medicação (MARS-5, versão simplificada)2, sobre controle ambiental5 e crenças populares sobre a asma6, além de avaliação do controle da asma pelo Asthma Control Test (ACT)7.

Esses pacientes, na maioria com asma moderada ou grave, vinham sendo tratados com corticosteroides inalados, eram polissensibilizados, foram orientados sobre controle do ambiente e incentivados à prática de atividades físicas4. Como resultados, os autores observaram pior adesão ao tratamento entre os que acreditavam em um ou mais mitos sobre asma e seu tratamento. Boa adesão às medidas de controle do ambiente foi identificada por 51% dos pacientes. Documentou-se associação significante entre controle total da asma, avaliada pelo ACT, e a boa adesão à medicação4.

Esse estudo nos mostra que apesar do reforço contínuo sobre as medidas terapêuticas (controle de ambiente, medicamentos, atividade física, saúde mental, entre outras) prescritas no acompanhamento de pacientes com asma, certamente realizado em serviço especializado, a taxa de adesão ao tratamento, embora apontada como boa, não foi a ideal. Certamente, essa taxa de adesão foi influenciada por crenças e mitos relacionados à asma, como apontado no estudo. Nesse sentido é importante que a decisão sobre a escolha da medicação (inalatória, dispositivo), se dividida com o paciente e familares, possa melhorar a sua segurança e confiança com relação ao tratamento. Esse ato reflete a importância do papel da educação na asma, sobretudo na criança.

Em conclusão, apesar dos avanços no monitoramento da adesão ao tratamento da asma obtidos nos últimos anos, ainda há um longo caminho a percorrer para criar a ferramenta de monitoramento ideal. Questionários de automonitoramento adaptados e validados para crianças pequenas com asma, além de algumas medidas mais objetivas, ainda são necessários para a prática rotineira de cuidados de saúde de difícil obtenção.

 

Referências

1. 2022 GINA Main Report. Disponível em: https://ginasthma.org/wp-content/uploads/2022/07/GINA-Main-Report-2022-FINAL-22-07-01-WMS.pdf. Acessado em setembro de 2022.

2. Cohen JL, Mann DM, Wisnivesky JP, Home R, Leventhal H, Musumeci-Szabó TJ, et al. Assessing the validity of self-reported medication adherence among inner-city asthmatic adults: the Medication Adherence Report Scale for Asthma. Ann Allergy Asthma Immunol. 2009;103:325-31. doi: 10.1016/s1081-1206(10)60532-7.

3. Pearce CJ, Fleming L. Adherence to medication in children and adolescents with asthma: methods for monitoring and intervention. Expert Rev Clin Immunol. 2018;14(12):1055-63. doi: 10.1080/1744666X.2018.1532290.

4. Serrano RA, Campos IG, Aroni BP, Lana J, Riedi CA, Chong-Neto HJ, et al. Avaliação da adesão ao tratamento da asma em crianças: a influência do atendimento especializado. Arq Asma Alergia Imunol. 2022;6(3):360-8.

5. Jentzsch NS, Camargos PAM, Melo EM. Adesão às medidas de controle ambiental na asma. Rev Bras Alerg Imunopatol. 2002;25(6):192-9.

6. Roncada C, Oliveira SG, Cidade SF, Rafael JG, Ojeda BS, Santos BR, et al. Asthma treatment in children and adolescents in an urban area in southern Brazil: popular myths and features. J Bras Pneumol. 2016;42(2):136-42. doi: 10.1590/S1806-37562015000000166.

7. Roxo JP, Ponte EV, Ramos DC, Pimentel L, D'Oliveira Júnior A, Cruz AA. Portuguese-language version of the Asthma Control Test. J Bras Pneumol. 2010;36(2):159-66. doi: 10.1590/s1806-37132010000200002.

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