Holofotes e microfones estão voltados para a Imunologia
Spotlights and microphones are turned on Immunology
Fernando M. Aarestrup
Editor Adjunto dos Arquivos de Asma, Alergia e Imunologia. Universidade Federal de Juiz de Fora. Serviço de Alergia e Imunologia Clínica - Hospital Maternidade Therezinha de Jesus - Juiz de Fora, MG, Brasil
Prezados leitores dos AAAI,
Os desafios de nossa especialidade Alergia e Imunologia Clínica nos tempos atuais da pandemia da COVID-19 são enormes.Termos e frases típicas de nossa especialidade passaram a ser comumente utilizados pela população. As pessoas comentam sobre imunidade, anticorpos, linfócitos; enfim passaram a utilizar o vocabulário específico da resposta imunológica em conversas no dia a dia. Nos diversos veículos de imprensa e nas redes sociais, informações sobre como funciona o sistema imunológico, particularmente explicando estratégias de imunização, modificaram completamente o imaginário sobre a ciência e a vida real. O que parecia um conhecimento científico distante que interessava somente à medicina passou a ser o assunto do momento.Todos querem saber como está a sua imunidade. Nesse contexto, os especialistas em Alergia e Imunologia Clínica acabaram por ficar diante de enormes desafios quanto ao atendimento clínico e comunicação com as pessoas.
Com a pandemia da COVID-19, em um período de pouco mais de um ano, ocorreu uma evolução exponencial de difusão do conhecimento sobre Imunologia. Foram desenvolvidas novas estratégias de imunização para uma doença com disseminação global, direcionando a atenção da humanidade sobre a Ciência e a Medicina, particularmente na área de Imunologia. A partir de 2020, os artigos publicados nos AAAI passaram a refletir essa nova realidade. No presente número, o assunto urticária e COVID-19 tem particular destaque na seção de artigos especiais. A comunicação clínica sobre mastocitose sistêmica e COVID-19 expressa de maneira exemplar a relevância do médico Alergista e Imunologista Clínico nesse momento da humanidade; acredito que nossa especialidade é certamente a única capaz de possuir um conhecimento sólido para abordar imunização em pacientes com mastocitose sistêmica.
Esse fenômeno dos "holofotes da comunicação" estarem voltados para a Imunologia acontece concomitantemente com a revolução que estamos vivendo com a era do emprego de anticorpos monoclonais no tratamento de doenças imunoalérgicas. Todos nós já ouvimos estas frases no passado recente: "este negócio de anticorpo monoclonal é coisa da indústria farmacêutica", "dificilmente a população terá acesso ao tratamento com biológicos", "anticorpo monoclonal somente será utilizado no futuro e em países desenvolvidos". Pois bem, prezados leitores, o emprego de biológicos no tratamento das doenças imunoalérgicas faz parte do nosso presente. Com a nova legislação da Agência Nacional de Saúde (ANS) sobre o assunto, foi possibilitado o acesso aos biológicos com maior facilidade. Ouso dizer que com esse novo cenário, nossa especialidade atingiu um novo patamar profissional. O médico que conhece profundamente Imunologia está preparado para o presente e para o futuro. Os artigos publicados neste número da AAAI sobre eficácia e segurança do dupilumabe no tratamento da rinossinusite crônica com polipose nasal e o uso deste biológico na urticária crônica espontânea (UCE) refratária ao omalizumabe abordam essa realidade atual de nossa especialidade.
Este ano, a Imunoterapia com Alérgenos (ITA), que representa o estado da arte de nossa especialidade, está fazendo aniversário de 110 anos. Somente o médico Alergista e Imunologista Clínico tem qualificação para realizar testes alérgicos, identificar os causadores do processo alérgico e modular o sistema imunológico utilizando a imunoterapia com extratos alergênicos. Por incrível que pareça, a centenária estratégia de imunoterapia com alérgenos representa os primórdios da moderna Medicina de Precisão. O que caracteriza a Medicina de Precisão é o reconhecimento de moléculas específicas e o emprego de estratégias de modulação do sistema imunológico, atuando sobre alvos específicos da fisiopatologia e permitindo o controle das doenças. Na verdade, os Alergistas e Imunologistas Clínicos fazem Medicina de Precisão há muito tempo. Nossa especialidade tem uma janela de oportunidade para demonstrar o nosso preparo na capacidade de modular o sistema imune. Nosso passado e nossas origens na utilização da imunoterapia com alérgenos se encontrou com o momento presente do uso de biológicos no tratamento de doenças alérgicas e imunológicas. Sabemos fazer ITA tanto quanto a terapêutica com biológicos, e podemos contribuir com a melhoria da saúde das pessoas, principalmente neste novo contexto no qual a Imunologia é destaque. Neste número dos AAAI, o artigo original "Diagnóstico molecular e seleção de imunoterapia em uma população portuguesa sensibilizada ao pólen de gramíneas e de oliveira" representa de maneira inequívoca como nossa especialidade pode contribuir na era da Medicina de Precisão, utilizando conhecimentos que começamos a desenvolver há 110 anos associados aos novos conhecimentos de imunologia molecular.
Nos momentos difíceis da humanidade ocorrem grandes mudanças, surgem novas oportunidades, emergem novas lideranças e a história constrói novos rumos. Nossa especialidade tem a oportunidade de evoluir muito neste cenário atual. Acredito em nossa liderança nesse processo de tornar cada vez mais viável a imunomodulação no tratamento de várias doenças. Precisamos investir maciçamente na capacitação dos médicos Alergistas e Imunologistas para que possamos enfrentar os desafios do presente e pós-pandemia de COVID-19. O AAAI, periódico científico oficial da ASBAI e da SLaai, certamente, é um valioso instrumento para prepararmos nossa especialidade para o exercício profissional e acadêmico nestes novos tempos.
Boa leitura e bom estudo a todos!