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Revista oficial da Associação Brasileira de Alergia e Imunologia ASBAI
Revista oficial da Sociedad Latinoamericana de Alergia, Asma e Inmunología SLaai

Número Atual:  Abril-Junho 2017 - Volume 1  - Número 2


CARTA AO EDITOR

Poluição, aquecimento global e alergia

Pollution, global warming, and allergy

Nelson Rosário Filho


DOI: 10.5935/2526-5393.20170031

Prof. Titular de Pediatria, Universidade Federal do Paraná


Nao foram declarados conflitos de interesse associados à publicaçao desta carta.




Prezado Editor,

Em abril de 2016, durante a Semana Mundial de Alergia promovida pela Organizaçao Mundial de Alergia (WAO), a Associaçao Brasileira de Alergia e Imunologia (ASBAI) realizou em Curitiba o "Workshop sobre Poluiçao, Mudanças Ambientais e Pólen: impacto nas doenças alérgicas". Deste workshop foi gerado um documento publicado no WAO Journal (D'Amato et al. World Allergy Organization Journal (2017) 10:11 DOI 10.1186/s40413-017-0142-7) do qual foi extraído o texto a seguir.

As alteraçoes climáticas representam uma enorme ameaça à saúde global, afetando os suprimento de alimentos, a qualidade do ar e da água, o clima, a economia e outros fatores determinantes da saúde1,2.A poluiçao do ar está estreitamente associada às alteraçoes climáticas1-4. Nos últimos 50 anos, a temperatura global aumentou acentuadamente1. A maior parte do aumento observado nas temperaturas médias globais é devido ao aumento observado nas concentraçoes antropogênicas de gases com efeito de estufa1. Os principais determinantes das emissoes de gases com efeito de estufa sao a produçao de energia, transportes, agricultura, produçao de alimentos e a gestao de resíduos, e as tentativas de atenuar as alteraçoes climáticas terao de abordar cada uma deles. Foi observado um enorme aumento nas concentraçoes de dióxido de carbono (CO2) nas últimas décadas1. O CO2 é o mais importante gás de efeito estufa e a sua concentraçao atmosférica aumentou de um valor pré-industrial de cerca de 280 ppm para 379 ppm em 20051. Cerca de 75% das emissoes de CO2 na atmosfera durante os últimos 20 anos resultaram da queima de combustíveis fósseis; a maior parte do restante resultou de mudanças no uso do solo, especialmente o desmatamento1. A mesma tendência ocorreu para os outros gases de efeito estufa: metano (CH4) e óxido nitroso (N2O)1. No entanto, é importante considerar que após reduzir as emissoes de CO2 e as concentraçoes atmosféricas se estabilizarem, a temperatura do ar de superfície continuará subir lentamente durante um século ou mais. Além disso, o aumento das temperaturas contribui para a elevaçao das concentraçoes de ozônio (devido a maior incidência de luz solar e temperaturas mais elevadas) e material particulado em nível do solo (devido a queimadas, secas, desertificaçao, tempestades de areia e um aumento do uso de carvao para geraçao de energia)1,2. O papel da floresta, particularmente a Amazônica (a maior floresta tropical da Terra), na mitigaçao das mudanças climáticas é crítico.

Conjunto crescente de evidências indica que as alteraçoes climáticas têm forte impacto na saúde respiratória, particularmente nas doenças alérgicas respiratórias1-4.

As alteraçoes climáticas estao correlacionadas com a polinose por várias razoes5:

- aumento e crescimento mais rápido das plantas;

- aumento da quantidade de pólen produzido por cada planta;

- aumento da quantidade de proteínas alergênicas contidas no pólen;

- aumento no tempo de início do crescimento da planta e, portanto, o início da produçao de pólen; e

- estaçoes de pólen mais precoces e mais longas.

Além disso, as plantas florescem mais cedo em áreas urbanas do que nas áreas rurais correspondentes com polinizaçao anterior de cerca de 2-4 dias. A contagem de pólen pode aumentar com o aumento dos níveis de dióxido de carbono, o aumento da temperatura ou início mais cedo da primavera6. Com o aquecimento a longo prazo, é provável a mudança dos padroes de habitat e densidade de espécies de plantas, com movimentos graduais para norte no Hemisfério Norte e mais ao sul no Hemisfério Sul7. A mudança no uso do solo também pode desempenhar um papel relevante, especialmente para algumas espécies alergênicas, como gramíneas no Sul do Brasil. No entanto, a maioria dos dados provém da análise da distribuiçao do pólen no ar, esses achados sao potencialmente tendenciosos pelo fato de polens serem transportados por longas distâncias8.

A alergia ao pólen é frequentemente usada para estudar a inter-relaçao entre poluiçao do ar e doenças respiratórias alérgicas (rinite e asma).

Partículas paucimicrônicas portadoras de alérgenos derivadas de plantas podem interagir com poluentes atmosféricos9. Estas partículas, originadas ou nao do pólen, sao capazes de atingir as vias aéreas periféricas com ar inalado, induzindo asma em indivíduos sensibilizados.

Como reduzir a poluiçao do ar e o aquecimento global: o papel das florestas brasileiras e sua mensagem ao planeta

As florestas tropicais cobrem menos de 10% de toda a área de terra (1,8 x 107 km2) e mais de metade da área de floresta tropical (1,1 x 107 km2) é representada por florestas tropicais úmidas. A Bacia Amazônica contém a maior floresta tropical da Terra, quase 5,8 milhoes de km2, e ocupa cerca de 40% da América do Sul; mais de 60% da Bacia está localizada no Brasil e o restante na Bolívia, Colômbia, Equador, Guiana Francesa, Guiana, Peru, Suriname e Venezuela.

As florestas tropicais capturam grandes quantidades de CO2 atmosférico10-13. O acúmulo de carbono na biosfera terrestre tropical contribui fortemente para a diminuiçao da taxa de aumento de CO2 na atmosfera, resultando na reduçao do efeito estufa4. As florestas tropicais foram estimadas em 32-36% da Produtividade Primária Líquida (NPP) terrestre, que é a diferença entre a fotossíntese total da floresta e a respiraçao da planta14-15. Desta forma, as florestas tropicais têm atuado como um forte sorvedouro de carbono por décadas.

Em grande parte impulsionado pelos esforços do Brasil para deter o desmatamento nos últimos anos, as taxas de desmatamento da Amazônia brasileira e toda a bacia declinaram na segunda metade da última década, o que resultou em uma reduçao significativa das emissoes de carbono.

A reduçao do desmatamento na Amazônia brasileira reduziu a contribuiçao do desmatamento para as emissoes globais de carbono pelo uso do solo de 17% nos anos 90 e início dos anos 2000, para 9% até 201016.

 

CONCLUSOES

As alteraçoes climáticas afetam muitos sistemas físicos e biológicos, incluindo os sistemas imunológico e respiratório, que sao críticos para a saúde humana, e é previsível que os fatores ambientais de risco terao efeito mais forte nas próximas décadas17-19. As alteraçoes climáticas interagem e afetam a poluiçao do ar e a polinose, que por sua vez aumenta a frequência e gravidade da asma, e a expressao clínica das doenças alérgicas1-4.

O que podemos fazer para diminuir os efeitos dos fatores ambientais que afetam as doenças alérgicas respiratórias? As medidas sugeridas sao: incentivar políticas de promoçao do acesso a fontes de energia nao poluentes; reduzir o tráfego privado nas cidades e melhorar os transportes públicos; diminuir o uso de combustíveis fósseis e controlar as emissoes dos veículos; plantar árvores nao alergênicas nas cidades e, nesse contexto, a implantaçao de novas árvores em parques e vias públicas deve ser avaliada por especialistas em alergia, a fim de evitar espécies altamente alergênicas.

Muitas medidas para reduzir as emissoes de gases de efeito estufa podem ter benefícios positivos para a saúde. Estratégias para reduzir as mudanças climáticas e a poluiçao do ar sao de natureza política, mas os cidadaos e, em particular, os profissionais de saúde e as sociedades, devem ter voz no processo decisório em apoio a políticas limpas, tanto nacionais como internacionais.

 

REFERENCIAS

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2. D'Amato G, Holgate ST, Pawankar R, Ledford DK, Cecchi L, Al- Ahmad M, et al. Meteorological conditions, climate change, new emerging factors, and asthma and related allergic disorders. A statement of the World Allergy Organization. World Allergy Organ J. 2015;14;8:25.

3. D'Amato G, Vitale C, Lanza M, Molino A, D'Amato M. Climate change, air pollution, and allergic respiratory diseases: an update. Curr Opin Allergy Clin Immunol. 2016;16:434-40.

4. D'Amato G, Pawankar R, Vitale C, Lanza M, Molino A, Stanziola A, et al. Climate change and air pollution: effects on respiratory allergy allergy. Asthma Immunol Res. 2016;8:391-5. doi: 10.4168/ air.2016.8.5.391. Review.

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7. D'Amato G, Cecchi L, Bonini S, et al. Allergenic pollen and pollen allergy in Europe. Allergy. 2007;62:976-90.

8. Cecchi L, Morabito M, Domeneghetti MP, Crisci A, Onorari M, Orlandini S. Long-distance transport of ragweed pollen as a potential cause of allergy in central Italy. Ann Allergy Asthma Immunol. 2006;96:86-91.

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